quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Capítulo 10: A Senhora da Justiça

O SOM MORREU RAPIDAMENTE.

O homem que vinha era alto, forte, com um rosto marcado pelas batalhas. Seu elmo, aninhado em um de seus braços, era a característica mais marcante de sua armadura, tendo um rosto em cada lateral. Um rosto com um sorriso malicioso e um bondoso de expressão tristonha. Além disso, os olhos violeta do cavaleiro o concediam uma aura de mistério.

Caminhando lentamente, um pouco atrás de Isaac, vinha um homem vestindo um longo manto negro, vários colares e um elmo dourado completo que escondia seu rosto. Por trás da cabeça, um longo cabelo cinza pendia até a metade das costas.

Quando lorde Isaac de Gêmeos se posicionou em seu devido lugar, todos fizeram uma reverencia a presença santa do Grande Mestre, o representante máximo de Atena no Santuário. Ele se pôs no lugar vazio no centro do círculo, abaixo da maquete do Sistema Solar. Olhando a todos calmamente, parecia analisar cada um com seu olhar não visível. Ele deu um longo suspiro de cansaço.

– Bem vindos e agradeço a todos por terem despertado. Sei que foi algo extremamente inconveniente, mas preciso que fiquem atentos ao que vamos ouvir.

– Algo muito inconveniente sim, vossa Santidade – falou Aniel, mas logo baixou o tom de voz ao ser censurado pelos companheiros –, mas, da forma como fala, deve ser algo realmente merecedor de nosso sacrifício.

– Sua Santidade, perdoe-me, mas o senhor disse “ao que vamos ouvir”? – falou Delfos – Não será o senhor que irá falar nessa reunião.

– Sim, Delfos, não serei eu. Estou apenas como ouvinte. Se a reunião não fosse tão importante assim, eu a faria acontecer com o tempo certo predeterminado. Mas não foi eu quem a convocou.

– Então, quem foi…

Um raio de sol cruzou a sala, anunciando uma nova alvorada. Juntamente com a luz que agora começava a surgir no horizonte, uma presença pacífica cobriu o ar do ambiente. Era algo tranquilo, que acalmava os corações mais exaltados, os mais tristes, os mais malignos. Vindo por umas das aberturas laterais, acariciando uma das belas colunas com suas mãos delicadas, uma mulher belíssima, com um longo vestido rico em detalhes, caminhava em direção ao grupo. Todos estavam admirados com tamanha presença ali. Todos, inclusive o Grande Mestre, se puseram de joelhos diante da Senhora da Paz e da Guerra. A guia da humanidade. Atena.

Ela segurava o seu cetro na mão direita. Seu cabelo castanho encaracolado e com longas mechas estava perfeito, seus olhos azuis claros fariam qualquer um cair aos seus pés, apaixonado. Ela pediu para que todos se levantassem, pois gostava de falar com os seus cavaleiros como iguais. Ocupou o lugar vazio de Leão, ainda sem um cavaleiro para vestir a armadura.

– Bom dia, meus cavaleiros dourados. – suas palavras soavam como canto de ninfas – Desculpem por minha arrogância e pelo atraso momentâneo. Estava conversando com meu Pai. Fui eu que os chamei aqui. – fez uma curta pausa – O assunto é grave. Peço que prestem muita atenção no que direi.

“Há quase vinte anos, Atenas e Esparta vem disputando um conflito de importância humana, assunto que não é da importância dos Deuses. Os motivos políticos desta disputa todos já sabem: a questão da soberania ateniense sobre a Liga de Delos. Esparta nunca respeitou tal soberania e, aproveitando-se da situação crítica a qual se encontrava, aliou-se a outras Cidades-Estados a fim de destronar Atenas. Eis que a Guerra de Peloponeso teve início”.

Ninguém se atrevia a falar enquanto a deusa continuasse.

“Creio que tudo isso não lhes é novidade. Durante todos esses anos de guerra, a Grécia vem sofrendo perdas consideráveis. Está tornando-se frágil a ataques estrangeiros, e a desunião entre as Cidades-Estados alcançou proporções desagradáveis. A cada dia sinto a morte de preciosas vidas em um combate desumano. Foi por isso que mandei lorde Rhodes de Câncer para o campo de batalha, mas impedi que ele lutasse. Sua armadura reside aqui, no Santuário, até ele retornar. O conhecimento de Rhodes sobre as guerras estava ajudando a acabar com este conflito mais rapidamente. Tratados de paz estavam sendo ponderados e só precisávamos aguardar boas respostas. Mas agora…”.

Ela parou para respirar melhor. Estava nervosa, triste com algo. Sua preocupação era notável.

“Agora creio que não haverá paz. Há algum tempo não venho recebendo notícias das negociações e de alguma forma a armadura selada de Câncer libertou-se e foi ajudar seu guardião, o que implica em um grande perigo. Por fim, Ares, senhor da guerra e meu irmão, acredita que sou uma traidora do antigo código dos Deuses”.

Todos ficaram incrédulos com a notícia. Ares acreditava que Atena, a senhora da Justiça, quebrou um código que ela deu a vida para defender? Como ele se atreve a tanto?

“Ele alega que estou insana, obcecada pela minha causa. Alega que meu querer pela humanidade se tornou algo isolado somente a sociedade ateniense, que os tornei meus favoritos. Afirma que não estou orando por todos os humanos, e a maior prova seria o fato de não ter mandando também alguém para ajudar o lado de Esparta. Ele vê minha atitude como uma ação unilateral, achando que desejo a onipotência de Atenas sobre Esparta, sua cidade guardiã, assim como Atenas é para mim. Com tudo isso, Ares pediu permissão ao nosso Pai para cobrar vingança pelas minhas atitudes incoerentes”. Então se calou, respirando profundamente, pois cada palavra lhe apertava o coração.

– Isso quer dizer, minha Senhora, que a batalha nos alcançará? Ares deseja combater o Santuário com seus guerreiros, é isso?

– Sim, Telo de Escorpião. Sim… – sua voz quase sumiu quando terminou de falar.

– Mas isso tudo é um absurdo! – Aniel exaltou-se novamente, ignorando a reprovação dos companheiros – Como um deus se atreve a julgá-la mal, minha Senhora? Logo o seu irmão! Acreditar que a Senhora não é justa para com os humanos é o mesmo que dizer que somente a guerra resolve os problemas.

– Meu Pai concordou com Ares, jovem Aniel. Infelizmente teremos que combater Ares, pois se ele atingir sua meta, além de destruir todo o Santuário e banhar esta terra em sangue, ele será coroado como novo guia da humanidade. Todos os deuses sabem que Ares é incontrolável e sedento por guerras. Não é a toa que Esparta é uma cidade guerreira. Enquanto eu vivo pela paz, meu irmão vive pelo conflito. Não me cabe decidir as vontades humanas, mas devo guiá-los a um destino melhor. Meu Pai vos concedeu o livre-arbítrio, são vocês quem devem escolher qual caminho seguir. Ares me culpa por ter influenciado tal decisão diretamente. Desta forma, ele possui o direito de “corrigir o erro” a sua maneira, pois foi quem alertou nosso Pai para o fato. Logicamente ele escolheu o método que mais o agrada para me punir, através de uma Guerra Santa. Agora devo proteger não apenas os humanos, mas usar meus cavaleiros como escudo.

– Lutaremos! – Aniel prontificou-se – Lutaremos ao seu lado, pois esse é o nosso dever.

– Proteger a Senhora e a humanidade são nossa missão. – Ícaros apoiou Aniel – Se nós devemos lutar, que lutemos. Foram os guerreiros de Ares que atacaram o Santuário para dar aquele aviso. Então todos os cavaleiros lutaram se for preciso.

– Não! – Atena falou um pouco impaciente – Não quero que uma guerra aconteça! Já não basta a luta entre Atenas e Esparta pelo domínio da Grécia. Farei o que for necessário para impedir essa luta. Estão proibidos de incitar o espírito de batalha no coração dos outros cavaleiros!

Todos concordaram cabisbaixos, exceto Ícaros, que olhou do Grande Mestre para Atena.

– Acho que Sagitário concorda comigo, minha Senhora – falou o Grande Mestre, observando-a.

– Esse sentimento não mais pode ser contido, minha Senhora – disse Ícaros sério.

– E por que não? – perguntou a deusa.

– Porque os nossos soldados e Orrin de Cão Menor foram atacados por guerreiros de Ares. Além disso, a mensagem deixada a fogo no Portão Sagrado está sendo lida por aqueles que passarem pelo portão destruído. Todos já devem estar cientes da vingança de Ares. É só esperar que os acontecimentos noturnos passem e teremos um Santuário pronto para o combate hoje à tarde.

– Minha Senhora, Ares fez de tudo para que o Santuário por completo soubesse que ele quer uma guerra. – o Grande Mestre falou calmamente – Ele previu que a Senhora não desejaria tal conflito. Agora, as pessoas do Santuário se prepararão para o pior. Ares implantou o temor e a fúria no coração do Santuário. Confirmo a informação do lorde Ícaros. A guerra agora é inevitável. Mesmo que a Senhora nos proíba de lutar, Ares ainda atacará. Teremos que nos defender de uma maneira ou de outra.

Atena ouviu as palavras de seus cavaleiros e pensou a respeito. Entretanto, vendo que não havia opções, tomou sua decisão.

– Então vamos nos defender! Enquanto não permitir, ninguém deixará o Santuário. Resolverei isso a minha maneira. Esperemos que venham até nós, mas estaremos preparados!

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