terça-feira, 20 de outubro de 2015

Capítulo 09: Aqueles que se encontram

PARECIA ATÉ COINCIDÊNCIA.

Ícaros pensava sobre a sua parada repentina na frente da Casa de Virgem, e no destino que o havia impedido de entrar na casa do Oráculo. Agora, o segundo a chegar seria ele. Logo ele.

Delfos era um ser misterioso. Sua voz era suave e levemente afeminada, assim como seu jeito em andar, mas a sua postura era austera e ninguém jamais se atreveu a julgá-lo. O seu rosto nunca ficava exposto, mas, diferentemente do Grande Mestre, não usava máscara e sim um capuz junto à capa de sua armadura. Por vezes era possível ver seus lábios e nada mais. Alguns diziam que o olhar de Delfos poderia revelar verdades mais terríveis sobre quem os visse e que por isso o Grande Mestre o havia proibido de mostrar seu rosto. Outros fantasiavam que o seu rosto era tão belo no passado que os deuses o haviam amaldiçoado a uma feiura terrível que não podia ser vista sem matar um homem. Mas o que predominava na imaginação do Santuário era o fato dele ser cego, e aqueles que se atrevessem a ver seu rosto também compartilhariam desta maldição. Verdade ou não, algumas vezes Delfos observa tão profundamente alguém que é como se tentasse ver sua alma além da carne, chegando a assustar algumas pessoas. A verdade de fato continuava oculta pelo capuz do oráculo do Santuário.

Delfos posicionou-se no círculo, entre Leão e Libra. Como Libra havia desaparecido e Leão ainda não possuía um cavaleiro, ninguém o fazia companhia. Ele observou por debaixo do capuz a estrutura que pendia do teto.

– Não ficará, garanto – assentiu seguro.

– Excluindo o fato de ter lido meus pensamentos sem a minha autorização, como sabes se ela não irá? Delia é minha enteada e se preocupa comigo.

– Não irá, pois passei em sua Casa antes de chegar e a acalmei. Acompanhei a movimentação da noite pelo meu cosmo, e minhas “habilidades” – fez questão de destacar isso – permitiram que confirmasse as suas dúvidas. Mandei-a relaxar e fazer um bom chá para quando retornasse da reunião.

– Então já sabia que isso ia acontecer? Por isso veio mais cedo que todos, não?

– Pode-se dizer que tive um vislumbre. Viu Marte?

– Como? – por um momento Ícaros ficou confuso, mas então se lembrou do planeta que estava brilhando estranhamente para a época do ano, um brilho diferente – Ah, sim. Notei. Estava acordado observando a noite e vi seu brilho ameaçador. Acha que tem alguma coisa com o que houve aqui? – perguntou lembrando as palavras escritas a fogo no Portão Sagrado.

– Penso, mas somente Vossa Santidade poderá nos esclarecer mais sobre o assunto. Ele nos chamou…

Nesse momento, passos pesados acusaram a chegada de mais alguém. As portas se abriram e um aroma de terra molhada chegou às narinas de Ícaros. Um homem musculoso e alto entrou na sala. Sua capa quase não tocava o chão e o par de chifres dourados de seu elmo revelou lorde Edmond de Touro. Ele se posicionou no círculo e, olhando amigavelmente para Ícaros, fez um aceno com a cabeça, sendo retribuído. Seus olhos analisaram a sala.

– Estranho. Geralmente sou sempre o quinto a chegar. Onde estão Capricórnio e Aquários? Eles sempre estão aqui cedo – sua voz era grave e firme, de um homem de respeito e poder.

– Estou aqui, Touro.

Edmond havia deixado as portas abertas ao passar, e por elas entrava um cavaleiro magro e pouco baixo. Não era muito esbelto, como o Touro, mas o seu curto cabelo castanho penteado para cima era inconfundível. Trazia aninhando em seu braço esquerdo o elmo da armadura com um longo par de chifres que se projetavam para frente.

– Aniel de Capricórnio a sua disposição, meu amigo. Demorei a chegar devido o horário, que não poderia ser mais impróprio. Espero que o Grande Mestre tenha uma ótima notícia para nos chamar aqui tão cedo. Estava muito bem na minha Casa quando fui perturbado pelos criados dizendo que o Relógio havia ascendido e…

– Sempre reclamando, não é mesmo Aniel? – uma voz séria penetrou no recinto, bem como uma brisa gélida que aumentou o frio no local. Um cavaleiro com cabelo negro, pouco longo e liso, olhos anil e uma cicatriz no lado esquerdo do rosto entrou na sala. – Será que um dia seremos agraciados pelo seu silêncio?

– Ah, cala boca gelado! – brincou Aniel – Você acha mesmo que eu me importo com isso? Não é só porque você é o poderoso Andreus de Aquários que pode sair mandando em quem você bem entende.

– Sabes que não é isso que quis dizer… – Andreus respondeu educadamente.

– Tolos são os que discutem por causa de uma reclamação. A vida está além de briguinhas tolas e infundadas. Esperava mais de você, Andreus. Um homem tão sábio deveria se portar como tal, e não fazer ironias ofensivas aos jovens exaltados como Aniel.

Um homem de cabelo loiro que alcançava à cintura e olhos profundamente verdes havia chegado. Sua armadura tinha detalhes de escamas e barbatanas. Sua beleza era tal que mais parecia uma mulher. Ao ficar em sua posição, abraçou os braços e deixou uma das pernas inclinada. Era lorde Narcissus de Peixes. Acompanhando-o havia um homem de cabelo castanho curto e encaracolado, olhos castanhos, alto e de boa forma. De seu elmo se estendia uma longa cauda segmentada e com um ferrão na ponta.

– Concordo com Narcissus. Acho que, como a elite entre os cavaleiros, deveríamos nos portar como tal, e não ficar fazendo estas brincadeiras jocosas – era o lorde Telo de Escorpião.

Ícaros falou quando todos tomaram suas posições.

– Bem, creio que todos chegaram. Lorde Timeus de Áries está treinando um discípulo e é muito provável que não tenha tempo de receber algum chamado, quanto mais de responder. Lorde Rhodes de Câncer ainda está em campanha com as tropas atenienses na luta contra a Liga de Peloponeso. A armadura de Leão ainda não possui um escolhido. Falta mais alguém?

– Obrigado por não se lembrar de mim, lorde Sagitário.

Todos olharam na direção das portas, para a origem da voz. Era Isaac de Gêmeos.

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