terça-feira, 29 de setembro de 2015

Capítulo 03: A mulher com o dom da cacofonia

SOMENTE O VENTO ERA AUDÍVEL.
Antes Orrin estava relaxado, mas agora seus sentidos estavam apurados. A amazona demonstrava o mesmo. O ambiente exalava tensão. Numa batalha entre cavaleiros, o primeiro passo pode ser o último. Aquele era o momento para analisar o adversário, focando cada mínimo movimento do outro.

Orrin então tomou uma atitude. Relaxando a postura, calma-mente retirou o manto que usava preso aos ombros. A mulher o acompanhou com o olhar. Sabia que aquele gesto não era agressivo, mas que viria de depois poderia ser.

– Eu gosto de saber com quem luto para que seu túmulo tenha um nome.

– Não será necessário. Isso posso lhe garantir, Cão Menor.

Quem é essa mulher? Não há uma armadura como essa entre as constelações de Atena. Lembra um morcego. A semelhança era notória. A mulher possuía uma armadura sombria que variava sua tonalidade entre tons azuis escuros, com detalhes em vermelho. Seu longo cabelo ruivo tinha uma tonalidade próxima ao dos olhos, vermelho-sangue, que lembravam muito o brilho maligno de Marte. Além disso, sua armadura tinha asas semelhantes às de morcegos, que podiam se prender aos braços da amazona quando desejasse ou ficar recuadas às suas costas, como estavam naquele momento.

Orrin então segurou o manto com o braço estendido.

– Façamos o seguinte: quando o manto tocar o chão, começa-mos. De acordo?

– Que seja. – respondeu indiferente.

A princípio, Orrin evitou o combate imediato. Queria estar pronto mentalmente. O vento estava esperando ansiosamente por aquele momento. A noite toda tentara inutilmente arrancar o manto do cavaleiro. Então o largou. O vento levou o manto para o alto, mas logo parou de soprar e o manto ficou preso em uma lápide alta. Com uma velocidade de cortar os ouvidos, ambos, Orrin e invasora, arremessaram-se um contra o outro.

O choque foi caótico. Uma grande onda sísmica se espalhou invisível ao redor deles. Todo o solo tremeu com o impacto dos dois. Orrin sentia uma forte dor no estômago. O joelho da amazona havia o acertado em cheio, evitando por pouco o coração. Numa fração de segundos, ambos se recuperam do primeiro ataque e investiram novamente. A velocidade de seus ataques era fenomenal, mal era possível acompanhar. Orrin, que estava temeroso, confirmou suas expectativas. Ela é poderosa, avaliou enquanto aplicava um gancho violento que arremessou sua adversária para os céus, deve ser uma amazona de bronze de alto escalão, superando até mesmo alguns cavaleiros de prata. Seus movimentos são graciosos como o voo de um pássaro, mas ainda há muita brutalidade em seus ataques, o que os torna fortes, mas lentos certas vezes e fáceis de serem percebidos.

A mulher ganhava cada vez mais altitude. Dez, quinze, vinte metros, até que com uma acrobacia se recuperou do gancho recebido e bateu as asas para manter altitude. Orrin estava sorrindo lá embaixo. Por que ele está sorrindo? Ele recebeu uns quinze golpes poderosos e parece que não sentiu nada, somente o primeiro. Sem problemas. Se meu adversário acha que pode me vencer com tanta facilidade, então vou lhe mostrar um pouco do meu talento musical, sorrindo em resposta.

Por um momento, Orrin não sabia o que a amazona estava fazendo, até sentir o poderoso fluxo de cosmo que havia sentido pouco antes do combate. A mulher recuou um pouco com o corpo, como se para tomar impulso, e realizou um mergulho mortal. Em queda livre, ela preparou suas garras e as estendeu para atacar o adversário. Pensando rápido, Orrin deu um grande salto para trás, fazendo a amazona destruir o chão ao pousar. Mas, antes dele ter ganhado altitude com ou da poeira ter levantado com o poderoso ataque, a mulher ergue o rosto em sua direção.

– SONIC EXPLOSION !

Nenhum som foi audível. Vendo somente os lábios da mulher mexendo, Orrin achou que ela havia reclamado de dor, mas logo percebeu o seu engano. Viajando na velocidade do som, uma quase invisível onda sonora azulada cruzou o ar partindo da amazona até atingir o cavaleiro. Todo o seu corpo ressoou com o ataque, e ele ouviu seus tímpanos zunirem a ponto de explodirem. Seus líquidos internos aqueceram-se de maneira extremamente rápida e então sentiu um impacto colossal, arremessando-o no chão.

Quase surdo, sentindo dor nas suas veias e em todo o corpo, Orrin caiu no chão de joelhos sem equilíbrio, com os olhos semi-abertos e o sangue saindo em pequenas quantidades de ouvidos, boca e nariz. Que ataque cruel. Ela usou um ataque sônico quase imperceptível. Um verdadeiro ataque surpresa. Creio que não foi totalmente invisível por conter uma grande quantidade de cosmo.

Satisfeita com o resultado, a invasora andou sensualmente em sua a Orrin, olhando-o com o canto dos olhos e passando a língua maliciosamente entre os lábios. As suas asas fecharam-se ao redor do corpo, formando uma capa protetora. Estava contentíssima. Ela é realmente poderosa e age como um morcego usando o som ao seu favor, com a diferença que enxerga perfeitamente bem, auxiliando os seus reflexos. Um morcego que enxerga normalmente e ainda pode usar seu sonar! Um inimigo a altura.

Orrin levantou, pondo-se na ofensiva e observou a amazona atentamente. Ela pareceu um pouco surpresa, como se esperasse que ele desistisse e recebesse de bom grado o golpe final. Ficando ainda mais satisfeita, aproximou-se mais cautelosa, mas mantendo seu andar sensual.

– Você é forte, cãozinho. Surpreendeu-me! Pensei que estaria surdo só de receber meu ataque, ou cego, mas ainda vejo que me observa muito bem e seus ouvidos estão zumbindo de maneira agradável.

– Foi você quem me surpreendeu. Seu cosmo pode ter o nível de uma amazona de bronze, mas não está longe dos cavaleiros de prata, assim como eu. Foi um belo ataque, mas agora que eu o conheço não poderá repeti-lo.

– É o que veremos, cavaleiro de Atena.

*     *     *

UM SER PROFANO SE APROXIMAVA CADA VEZ MAIS DO PORTÃO SAGRADO DO SANTUÁRIO. Um soldado de prontidão observou a sombra que se movia ameaçadoramente. Erguendo a sua lança, ele esperou pela aproximação do homem coberto por um sobretudo marrom escuro, parando próximo ao soldado.

– Alto lá! – exclamou o guardião do Portão – Quem és tu que se aproxima do Santuário de Atena?

– Eu? – o homem ergueu um pouco mais o rosto. Dois brilhos avermelhados e malignos eram visíveis daquele ângulo. – Eu sou um mensageiro de outra península. Sou um ser que vem até aqui com uma missão: destruir!

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